Focar em outcomes não é fácil (com Marty Cagan)
Por que migrar de outputs para outcomes é muito mais difícil do que parece.
Recentemente, eu tive o prazer de escrever um artigo em conjunto com Marty Cagan, lenda da gestão de produtos digitais, fundador do Silicon Valley Product Group, e autor dos livros Inspirado, Empoderado e Transformed.
Atendendo a pedidos, aqui está a versão traduzida do artigo (os links apontam para materiais em inglês). Embora ele seja voltado para quem desenvolve produtos e serviços baseados em tecnologia, pessoas de outras áreas também podem aprender com o post.
A versão original do artigo está no site da SVPG.
Nota do Marty Cagan:
Meu coautor para este artigo é o consultor e mentor de produto Felipe Castro. Conheço Felipe há muitos anos, e ele colaborou comigo no conteúdo relacionado a outcomes e OKR em cada um dos meus livros. Felipe se especializa em ajudar empresas a migrarem de outputs para outcomes.
No nível mais alto, mudar para o modelo de produto significa mudar de outputs para outcomes.
Conceitualmente, isso é muito simples e o valor é intuitivamente claro para a maioria das pessoas, mas na prática, isso é difícil.
Temos falado e escrito sobre a transição para outcomes em todos os nossos livros há muitos anos.
A boa notícia é que muitas outras pessoas perceberam que apenas entregar funcionalidades que não ajudam de fato os clientes, ou não ajudam o negócio, não é muito significativo. E hoje, muitos times e empresas fortes mudaram com sucesso seu foco para outcomes.
Mas para muitas empresas, a mudança para outcomes rapidamente fica estagnada.
Neste artigo, gostaríamos de tentar abordar alguns dos erros e confusões mais comuns que surgem quando as organizações tentam mudar para outcomes.
Também discutiremos algumas das nuances importantes para aqueles que já pensaram sobre esses conceitos por algum tempo.
O Conceito de Outcomes
A ideia básica por trás de outcomes é fácil de explicar:
Todos sabemos que algumas das coisas que construímos fazem diferença, enquanto outras não. Essa diferença pode ser melhorar a vida de nossos clientes, melhorar a saúde do nosso negócio, ou até mesmo ajudar nossos times a trabalhar de forma mais efetiva.
Mudar de outputs para outcomes significa mudar nosso foco do que construímos (os outputs) para a diferença que queremos fazer (os outcomes).
Mas, como qualquer pessoa que já tentou mudar para outcomes pode confirmar, isso é muito mais fácil de falar do que de fazer.
Estruturando Outcomes
Quando falamos sobre um outcome, o estruturamos em torno de um problema a ser resolvido e as medidas de sucesso.
Especificamente, isso requer:
Dar aos times problemas claros e significativos para resolver.
Ajudar os times a definir como medirão se estão realmente resolvendo cada problema.
Instrumentar o produto para que os times possam entender imediatamente se estão alcançando o outcome desejado (ou seja, resolvendo o problema) e fazer ajustes com base nos dados.
Embora essa estrutura possa parecer simples, muitas empresas enfrentam dificuldades, pois ela representa uma mudança significativa de comportamento e de cultura.
Erros Comuns ao Mudar para Outcomes
– Pensar Que Você Pode Mudar Para Outcomes Sem Mudar Para O Modelo De Produto
De longe, o problema mais comum é pensar que você pode fazer sua organização focar em outcomes sem realmente fazer o trabalho de mudar sua organização para o modelo de produto.
Isso é compreensível, já que outcomes são intuitivos e conceitualmente simples. À primeira vista, não é óbvio por que seria necessário fazer uma série de mudanças estruturais para viabilizar outcomes.
É exatamente isso que aconteceu com milhares de empresas que acharam que poderiam simplesmente adicionar a técnica de OKR por cima de seus processos existentes, baseados em output e esperar alguma mudança significativa. Esse erro é o que alimentou a reação negativa a OKR em tantas empresas.
Mas a técnica de OKR surgiu a partir do modelo de produto e depende dele.
A técnica de OKR é bastante simples se você já estabeleceu o modelo de produto como sua forma de trabalhar.
Mudar para o modelo de produto envolve mudanças significativas em como você decide quais problemas precisa resolver, como resolve esses problemas e como constrói, testa e faz o deploy de suas soluções. Mas perceba que cada aspecto da mudança para o modelo de produto existe para permitir que sua organização alcance outcomes.
Então, a coisa mais importante a entender é que mudar para outcomes é a consequência de mudar para o modelo de produto.
– Deixar Que Métricas Existentes Ditem os Problemas a Resolver
Frequentemente, vemos empresas se limitando aos outcomes que podem ser medidos por seus indicadores atuais. Para todo o resto, elas usam outputs.
No entanto, frequentemente descobrimos que alguns dos problemas mais urgentes de clientes ou de negócios ainda não estão adequadamente cobertos pelos KPIs existentes.
Líderes de produto fortes não deixam que métricas existentes ditem quais problemas resolver ou quais medidas de sucesso usar. Eles sabem que precisam focar nos problemas mais críticos, mesmo que isso exija criar novos indicadores ou fazer trabalho adicional de instrumentação.
Uma técnica simples é garantir que um problema claro e relevante seja definido antes de se comprometer com métricas específicas.
– Problemas Vagos ou Ambíguos
Empresas organizadas em times de funcionalidade geralmente estão cheias de metas vagas que nenhum executivo pode definir ou medir adequadamente (por exemplo, "fornecer plataformas integradas"). Quando tudo o que você mede é a conclusão do projeto, não importa se suas metas são vagas.
Já empresas que adotam o modelo de produto investem tempo antecipadamente para definir problemas claros. Isso garante que estão trabalhando nos problemas certos — e economiza muito tempo depois.
Aqui estão vários exemplos do que são problemas claros:
Ajudar clientes a resolver problemas sem precisar nos contatar
Aumentar o percentual de entregas feitas no dia seguinte
Ajudar os pacientes a compartilhar dados com seus médicos de maneira simples e confiável
Reduzir o custo para adquirir um novo cliente
Reduzir os custos operacionais de atendimento
Reduzir a taxa de cancelamento de assinantes
Reduzir o tempo necessário para implantar um serviço novo ou atualizado em produção
Conectar candidatos a vagas mais compatíveis com seu perfil
Reduzir o tempo médio de atendimento em ligações ao suporte
Reduzir o tempo para um usuário produzir seu primeiro relatório mensal
Note que os problemas existem em diferentes níveis de granularidade ou "altitude". Alguns problemas são mais específicos e podem ser abordados por um único time de produto, enquanto outros são mais amplos e precisam ser abordados por múltiplos times de produto colaborando estreitamente. E alguns envolvem colaboração próxima com outros na empresa além dos times de produto.
Problemas relacionados à otimização de métricas existentes geralmente são os mais fáceis de articular (por exemplo, aumentar a conversão na página de checkout). Em outros cenários, chegar a um problema claro pode ser bastante desafiador, mas frequentemente é onde estão as grandes oportunidades.
A maioria dos desafios de medição e alinhamento são, na verdade, desafios de clareza. Quando você tem uma definição clara do que está tentando alcançar, fica mais fácil medir o sucesso, criar alinhamento entre stakeholders e descobrir soluções eficazes. Alcançar outcomes requer clareza.
– Não Ter Uma Estratégia De Produto Intencional
Os exemplos acima são todos problemas potencialmente importantes para resolver, dependendo da estratégia de produto da empresa.
Mas, como discutimos muitas vezes antes, muitas empresas não têm uma estratégia de produto intencional ou explícita. Elas têm metas de negócio e têm roadmaps de ideias de produto que esperam gerar resultados positivos.
A estratégia de produto representa os dados, a lógica e as decisões que levam de nossas metas de negócio de alto nível aos problemas específicos a serem resolvidos e outcomes a serem alcançados pelos vários times de produto.
Quando algumas pessoas ouvem a palavra "outcomes", elas imediatamente pulam para definições de resultados de negócio de alto nível—receita e lucro sendo os principais exemplos.
Essas metas de alto nível são certamente exemplos de outcomes, mas são mais tipicamente o resultado final de muitos outcomes diferentes, em muitos níveis diferentes de granularidade, todos contribuindo para o resultado final.
Por exemplo, nossos clientes estão tendo suas necessidades atendidas com nossos produtos? Quanto tempo leva para vender nossos produtos? Quanto tempo leva para um cliente começar a receber o valor? Por quanto tempo nossos clientes continuam a usar nossos produtos? Todos esses são outcomes que podem contribuir com impacto real para resultados finais como receita e lucratividade.
Em vez de ver outcomes isoladamente, às vezes é mais fácil pensar neles como dominós, com cada peça ajudando a derrubar a próxima.
É aqui que a estratégia se torna essencial: uma estratégia de produto adequada ajuda a identificar os problemas mais críticos que precisam ser resolvidos para entregar os objetivos de negócio.
Outra dimensão importante ao escolher outcomes é se está ou não dentro da capacidade de um determinado time de produto impactar diretamente o outcome desejado.
Um time não se sentirá empoderado para criar uma solução eficaz e alcançar o outcome necessário se não tiver acesso ou capacidade para fazer as mudanças necessárias.
Eles também provavelmente não descobrirão uma solução que funcionará para o cliente e o negócio se não puderem medir se estão fazendo o impacto necessário.
– Medir As Coisas Erradas
Quando olhamos para as medidas de sucesso, estamos tentando definir como saberemos se realmente resolvemos o problema. Certamente, apenas lançar uma funcionalidade não é suficiente.
Algumas pessoas confundem outcomes com o conceito muito mais geral de KPIs (Key Performance Indicators ou Indicadores-Chave de Desempenho). KPIs são simplesmente métricas que medem algum aspecto de um produto ou negócio.
A maioria dos negócios tem centenas ou até milhares de KPIs relevantes, que ajudam os líderes a avaliar a saúde de um produto ou negócio. Enquanto outcomes são medidos com KPIs, a grande maioria dos KPIs não são medidas úteis de outcomes bem-sucedidos.
Cada KPI é um ponto de dados, e esse ponto de dados pode fornecer pistas ou informações de apoio, mas estamos procurando o KPI (ou KPIs) que são medidas verdadeiras de nossos outcomes desejados.
Como um exemplo simples, o medidor de gasolina e o tacômetro no painel de um carro (movido a gasolina) são KPIs, mas se o outcome que você se preocupa é melhorar a eficiência de combustível, esses KPIs não estão realmente medindo se você está resolvendo o problema (por exemplo, aumentando quilômetros por litro).
É por isso que queremos definir um problema claro para resolver antes de discutir as métricas. O objetivo é medir se estamos resolvendo o problema selecionado, mesmo que isso signifique definir novos KPIs que ainda não acompanhamos hoje.
Uma técnica útil para encontrar bons KPIs para medir outcome é pensar sobre as mudanças desejadas no comportamento do usuário (por exemplo, a porcentagem de nossos clientes fazendo compras no aplicativo).
Mas tenha em mente que muitos problemas importantes não necessariamente impactam o comportamento do usuário. Lembre-se também que problemas a serem resolvidos podem se referir a problemas do cliente e/ou problemas da nossa empresa.
– Negligenciar a Coleta de Dados
Outro item que se torna inegociável se você quer mudar para outcomes é a necessidade de instrumentar tudo o que lançamos (referido como telemetria) para que os times possam entender imediatamente se estão resolvendo o problema e fazer ajustes com base nos dados.
No entanto, muitas empresas ainda não estão coletando e analisando seus dados como precisam—focar em outputs permite que elas tratem analytics e relatórios como algo "desejável".
Além disso, como discutido acima, muitos times evitam adotar as medidas adequadas de sucesso simplesmente porque ainda não têm a instrumentação necessária.
Se você quer focar em outcomes, precisará se comprometer a melhorar continuamente a telemetria do seu produto, criando novos KPIs e coletando dados adicionais onde necessário para medir se você está resolvendo os problemas desejados.
Confusões Comuns Sobre Outcomes
– Outras Formas de Pensar Sobre Outcomes
Várias pessoas têm explorado os mecanismos e as consequências dessa mudança para outcomes, e conteúdo verdadeiramente útil tem sido escrito sobre o assunto.
Alguns dos nossos favoritos são os outputs vs outcomes vs impacto de Jeff Patton, e a distinção de Teresa Torres entre outcomes de produto e outcomes de negócio.
Frequentemente nos referimos aos outcomes abordados pelos times de produto como outcomes de produto, e eles se somam para contribuir com outcomes de negócio (ou "resultados de negócio").
Outra maneira de pensar sobre isso é distinguir entre outcomes (a diferença que fazemos ao resolver problemas importantes) e impacto (os resultados de negócio de alto nível que esses outcomes ajudam a alcançar).
Essas distinções conceituais e simplificações podem ajudar as pessoas a se sentirem mais confortáveis com seu papel na mudança para outcomes.
Mas também é importante perceber que queremos encorajar os times de produto a abraçar trabalhos fora de sua área direta, para entender o problema e o que podem e devem fazer para resolvê-lo.
Por exemplo, para entender o que será necessário para resolver um problema que está aparecendo durante o processo de vendas, não é incomum que um gerente de produto passe tempo com vendas, indo a reuniões com clientes, observando as interações, para ver onde o problema pode estar.
– Inputs vs Outputs
A Amazon é um dos melhores exemplos do modelo de produto, mas internamente eles usam alguma linguagem em torno do termo "output" que pode causar confusão quando pessoas da Amazon usam essa linguagem externamente.
A Amazon enfatiza a importância de focar nos inputs, não nos outputs.
Isso significa focar nas "métricas de input" (por exemplo, seleção, preço e conveniência) que influenciarão as "métricas de output" (por exemplo, pedidos, receita e lucro).
Quando a Amazon enfatiza a necessidade de "gerenciar os inputs, não os outputs", isso significa focar em gerenciar as causas, não os efeitos.
Este também é um ponto importante e se relaciona diretamente com a estratégia de produto, mas não deve ser confundido com a definição de outputs, que são as coisas que construímos.
– Manter A Operação Funcionando
É fundamental sempre lembrar que nem tudo precisa ser um problema a ser resolvido com um outcome.
Sempre haverá uma lista de itens de “manter a operação funcionando” — tarefas geralmente menores, mas necessárias para que nossos parceiros de negócio consigam manter tudo rodando.
Resumo
Não há dúvida de que entregar outcomes é muito mais difícil do que entregar output. Requer novas competências, novas habilidades e uma abordagem diferente para definir e atribuir trabalho.
Há vários outros itens relacionados a outcomes além do que estamos destacando aqui. O livro EMPODERADO: Pessoas Comuns, Produtos Extraordinários fornece uma explicação muito mais abrangente com exemplos detalhados e estudos de caso.
Mas para aqueles times de produto que estão seriamente comprometidos em entregar valor real, resolver o problema subjacente para nossos clientes ou nosso negócio, e entregar os resultados de negócio necessários é a única medida real de sucesso.
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